2 de agosto de 2010

DEBATEPAPO COM FRANCISCO AURÉLIO E JÔ DRUMOND

Ao começar a ler "Ensaios de Leitura e Literatura Infantojuvenil", de Francisco Aurélio Ribeiro, logo em suas primeiras páginas ao se referir ao livro "Instrução Moral e Cívica" de Gaspar de Freitas, ele me remetei a um túnel do tempo...
Aos meus primeiros anos como aluna do Grupo Escolar "Irmã Maria Horta", quando este ainda ocupava o prédio da rua Afonso Cláudio, na esquina fronteira à  casinha de meus pais.  Eu estudei Geografia do Brasil no livro escrito por Gaspar de Freitas. Ele não possuía uma única fotografia, sequer um desenho  de nenhum dos acidentes geográficos alí ensinados.
Apenas textos. Que decorávamos. Aprendiamos, por exemplo, "ilha era uma porção de terra cercada por água por todos os lados". Minha querida professora Universina Nascimento anunciava: "Hoje vamos estudar o rio Amazonas!"
E com sua varinha ia tocando na aluna que deveria ir iniciar o assunto. Aí entrava o Gaspar de Freitas.
A aluna iniciava: "O rio Amazonas nasce nos Andes, no planalto de La Raia, nos confins meridionais do Peru, corre a princípio de sul para a norte e depois de leste para oeste..."
Nunca esqueci deste inicio do texto e olhe que já lá vão mais de sete décadas...
D. Universina a mandava sentar e dizia: "A próxima!" E a aluna seguia repetindo os ensinamentos de Gaspar de Freitas. Até que se chegava aos afluentes do rio Amazonas. "Diga os da margem direita!"
E a aluna ia dizendo os nomes, partindo da nascente até a foz. Sem titubiar. E ai de quem pulasse ou invertesse a ordem dos ditos afluentes!
Lembro-me de que eu não fazia a menor idéia do que eram "confins" nem "meridicionais".  Mas como nunca esqueci este início do texto, acho que eu gostava mesmo era da sonoridade dos vocábulos...
Já ginasiana, tive acesso aos primeiros livros de Geografia ilustrados. Que maravilha! Foi quando vi, com todos os detalhes, entre outros, como eram os vulcões. De como são formados. As fotos dos mais famosos que existem no mundo, dos que já provocaram grandes tragédias, como o Vesúvio e tantos outros. Aqueles que já encerram suas atividades e que são considerados extintos. Ou apenas adormecidos?
Fiz uma viagem ao passado, levada pelo livro de Francisco Aurélio.
No Debatepapo com a Jô Drumond, falou de sua obra infantojuvenil. Nos disse que as histórias contadas em seus livros infantojuvenis basicamente são aquelas que ouviu de alguém e por ele reproduzidas com  a arte de sua criatividade. Nos contou que em sua casa não havia livros.
Eu lembrei que na minha, também não. Porém, eu sempre gostei muito, muito de ler.
Minha mãe costurava para as filhas do casal . Nicanor e Maria Paiva. Uma vez, ao levar o produto de seu trabalho, falou para a d. Maria que também tinha uma filha, quase da mesma idade das filhas dela.
Ela, muito delicada, pediu que minha mãe me levasse, numa próxima vez.
Esta visita mudou minha vida. Sabendo que eu gostava de ler levou-me para conhecer sua biblioteca. A casa do casal, um sobrado, tinha aposentos com um fantástico pé direito. O que senti ao me ver naquele enorme aposento, com prateleiras que iam até o teto, repletas de livros, me tirou a fala. Foi um deslumbramento. Para aquela menina de oito ou nove anos, parecia impossível alguém poder ter tantos e tantos livros...
Dali para a frente, d. Maria passou a me emprestar alguns. Mas a minha, ao contrário da mãe de Marguerite Duras, esteve sempre muito atenta ao que eu lia. Deveria ser sempre leitura apropriada para a minha idade e compreensão. Lí toda a coleção do Tesouro da Juventude. Que horas maravilhosas passei lendo um a um todos os volumes. Quando eu voltava para devolver o livro que havia lido, d. Maria sempre queria saber o que eu tinha aprendido, do que mais gostara e porque. Sem talvez ter esta intenção, foi uma incentivadora do meu poder de crítica. No início, menina tímida, era difícil verbalizar o meu "parecer" sobre o que havia lido. Com o tempo, fui me soltando e já debatia com entusiasmo o que havia achado do livro, dos personagens, da trama urdida pelo autor(a).
Li Monteiro Lobato. Viajei com a Emília e seu pó de pirlim-pim-pim..
Li Machado de Assis, José de Alencar, Humberto de Campos, Érico Veríssimo... Juntamente com Tarzam, o rei dos macacos.
Já adolescente, mudamos para a cidade, indo residir no alto da rua Sete de Setembro, interrompendo esta boa fase de minha vida. A cidade ficava muito longe da praia do canto... Levava-se uma hora viajando de bonde...
Começando a trabalhar, sempre reservava um dinheirinho para comprar um livro.
Comprei aquelas publicações da revista "Seleções", quatro livros condensados em um só volume.
Francisco Aurélio diz que a escola não tem conseguido criar o gosto pela leitura entre os alunos, como se desejaria. Infelizmente. "Ler é ver o mundo e, mais do que isso, uma forma de reescrevê-lo, segundo o mestre Paulo Freire".
Foi uma noite muito feliz, parabéns aos debatedores e organizadores do DEBATEPAPO.
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